Carlos Alberto
Teixeira
O hábito de escrever voltou com força total e devemos isso em grande parte à
Internet e ao e-mail.Tem gente que não consegue passar um dia sequer sem checar
a caixa postal. Outros, mais enfronhados nó hábito, o fazem dezenas de vezes ao
dia, às vezes de cinco em cinco minutos. Não são poucos os que passam horas
escrevendo para os amigos, ou mesmo simplesmente reencaminhando para seus
conhecidos,mensagens que julgaram interessantes. Não devemos nos recriminar com
essa quase compulsão em ler e mandar mensagens de e-mail. Precisamos ter em
mente uma nuança especial da natureza humana: somos uma espécie narrativa.
Um artigo que li na revista Time há pouco tempo abordava essa nossa
característica humana tão notável, evocando o caso daquele submarino russo, o
Kursk, que explodiu não se sabe ainda por que motivo. O artigo citou a
revelação da mensagem final do capitão Dimitri Kolesnikov, endereçada à sua
esposa, como um típico exemplo dessa obsessão humana por escrever. O oficial
nunca saberia se um dia a patroa iria ler, mas, mesmo no escuro e à beira da
morte, arranjou um jeito de relatar o que se passava e como estava se sentindo.
Nós existimos pelo fato de contarmos histórias, de escrevermos relatos de
nossas situações e talvez, no futuro, nossos descendentes só poderão ter uma
idéia de como vivemos hoje se tivermos competência em contar nossas histórias
atuais. O que Dimitri fez no momento de sufoco, muitos outros já fizeram no
passado em situações similares. Quando um jato da Japan Airlines caiu, em 1985,
muitos passageiros usaram seus últimos minutos, em que a aeronave descia na
espiral da morte anunciada, para escrever cartas para seus entes queridos. Do
mesmo modo, quando os últimos ocupantes do Gueto de Varsóvia viram suas
famílias e companheiros morrendo doentes e com fome, ou levados em caminhões
para os campos de extermínio, sem que houvesse qualquer dúvida de que seus
próprios destinos seriam iguais, mesmo assim eles escrevinharam em qualquer
papelzinho seus pensamentos, poemas, fragmentos de suas vidas e enrolaram-nos
tão apertados quanto puderam, enfiando os rolinhos nas ranhuras entre os
tijolos do gueto. Escreveram simplesmente porque TINHAM que escrever, era quase
um impulso, um fato biológico.
Seja um e-mail, uma carta ou um papelote que vá virar rolinho, escrever tem a
ver com o sentido de liberdade. Você escreve uma frase e nunca sabe direito até
aonde ela o levará. A aventura de quem escreve se iguala à de quem lê. É essa
liberdade, compartilhada entre quem envia e quem recebe o e-mail, que constitui
a verdadeira conexão entre as pessoas, remontando ao contato entre o marujo e
sua esposa. Na hora em que tu do estava se acabando, Kolesnikov escreveu:
"Estou escrevendo às cegas". E quem não está?
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