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O Revólver do Senador


Fernando Sabino
O Senador ainda estava na cama, lendo calmamente os jornais, e eram dez horas da manhã. Súbito ouve a voz do netinho de quatro anos de idade por detrás da folha aberta, bem junto de sua cabeça:
– Vovô, eu vou te matar.
 Abaixou o jornal e viu, aterrorizado, que o menino empunhava com as duas mãos o revólver apanhado na gaveta da cabeceira.  Sempre tivera a arma ali ao seu alcance, para qualquer eventualidade, carregada e com uma bala na agulha. Nunca essa eventualidade se dera na longa sequência de riscos e tropeços que a política lhe proporcionara. No entanto, ali estava, agora, apanhado de surpresa, sob a mira de um revólver. O menino começou a rir de sua cara de espanto. 
Eu vou te matar – repetiu, dedinho já no gatilho. 
O menor gesto precipitado e a arma dispararia. 
Pensou em estender o braço e ao menos afastar o cano de sua testa, que já começava a porejar suor. Mas temeu o susto da criança, o dedo se contraindo no gatilho... Tentou falar e de seus lábios saíram apenas sons roufenhos e mal articulados. 
– Não me mata não – gaguejou, afinal: – você é tão bonzinho...  
– Pum! Pum! – e o demônio do menino sempre a rir, só fez dar um passo para trás; que o colocou fora de seu alcance. Agora estava perdido.  
– Cuidado, tem bala... – deixou escapar, e a voz de novo lhe faltou. Toda uma vida que terminava ali, estupidamente nas mãos de uma criança – de que adiantara?  Tudo aflição de espírito e esforço vão. Se alguém entrasse no quarto de repente, a mãe, a avó do menino... Que é isso, menino! Você mata seu avô! Com o susto... Senti o pijama já empapado de suor. Era preciso fazer alguma coisa, terminar logo com aquela agonia. Estendeu mansamente o braço trêmulo:
– Me dá isso aqui... 
– Mãos ao alto! – berrou o menino, ameaçador, dando passo para trás, e as mãos pequeninas se firmaram ainda mais no cabo da arma.
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Mais um texto de Fernando Sabino. Em comentários, dê um final para ele.
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Leda, com humor, traçou um final para o texto:
Nesse instante muita coisa passou pela cabeça de senador. Não havia entregado o revólver na Campanha Nacional do Desarmamento pois precisava se proteger. Era um político corrupto, a arma poderia ser sua salvação num momento de ameaça de ser delatado. E agora, seu neto, sem conhecer seu passado, o ameaçava!
O guri continuava com a arma em punho, longe de seu alcance. 

- Tem medo de morrer, vovô?- perguntou-lhe o neto.

Naquele momento,o garoto, sentindo o odor de calças borradas, largou o revólver, pôs o dedo no nariz, saiu correndo, gritando:

-Vovô está todo sujo.
O menino descobrira o que a nação inteira já sabia.
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E o final criado pela Amora não poderia faltar:
Então, o Senador disse para si mesmo: "Calma, calma, afinal você é um político ou não é?" E para a criança: "Claro, claro, meu netinho, já estou de mãos para o alto. E agora, onde você quer que eu me esconda?"

O garoto deu uma risada marota: -" Debaixo da cama, depressa!". 

-"Sim, sim! Exclamou o Senador, agachando-se e arrastando-se para debaixo da cama, como se a sua coluna fosse a de um jovenzinho. De lá, gritou para o neto:

- "Agora, é sua vez. Deixe a arma em cima da cama e procure um bom esconderijo...Agora mesmo, vou achar você!" O menino fez o mandado direitinho e foi assim, com alguma lábia e um pouco de esforço que o Senador conseguiu safar-se. E, vida afora, lá em Brasília ele continua safando-se quando o interpelam: "Claro, claro, os outros é que armaram tudo. eu não sei de nada..."
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 E o final dado pelo autor:
O Senador não teve outra coisa a fazer senão obedecer. 
E assim se compôs o quadro grotesco: o velho com os braços erguidos, o guri a dominá-lo com o revólver. De repente, porém, o telefone tocou.
– Atende aí ­– pediu o Senador, num sopro. 
Estava salvo: o menino tomou do fone, descobrindo brinquedo novo, e abaixou o revólver. O Senador aproveitou a trégua para apoderar-se da arma. Então pôs-se a tremer, descontrolado, enquanto retirava as balas com os dedos aflitos. O menino começou a chorar: 
Me dá! Me dá! 
A mulher do senador vinha entrando: 
–O que foi que você fez com ele? Está com uma cara esquisita... Que aconteceu?
– Acabo de nascer de novo – explicou simplesmente. 
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Sobre o autor:
Fernando Tavares Sabino, escritor e jornalista brasileiro, nasceu em Belo Horizonte em 12 de outubro de 1923 e faleceu no Rio de janeiro em 11 de outubro de 2004.
Em julho de 1999 recebeu da Academia Brasileira de Letras o maior prêmio literário do Brasil, "Machado de Assis", pelo conjunto de sua obra.

O valor do prêmio, R$40.000,00, foi doado pelo autor a instituições destinadas a crianças carentes. O desembargador Alyrio Cavallieri, ex-juiz de menores, revelou que em 1992, todos os direitos recebidos pelo autor do polêmico livro "Zélia, uma paixão" também foram distribuídos a crianças pobres.

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                        Por Adele

3 comentários:

  1. E aí, seguidores de cadeira cativa: Amora, Pandorah e Pansy. Estamos esperando seu final de texto!

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  2. Nesse instante muita coisa passou pela cabeça de senador. Não havia entregado o revólver na Campanha Nacional do Desarmamento pois precisava se proteger. Era um político corrupto, a arma poderia ser sua salvação num momento de ameaça de ser delatado. E agora, seu neto, sem conhecer seu passado, o ameaçava!
    O guri continuava com a arma em punho, longe de seu alcance.
    - Tem medo de morrer, vovô? perguntou-lhe o neto.
    Naquele momento,o garoto, sentindo o odor de calças borradas, largou o revólver, pôs o dedo no nariz, saiu correndo, gritando:
    -Vovô está todo sujo.
    O menino descobrira o que a nação inteira já sabia.

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  3. Então, o Senador disse para si mesmo: "Calma, calma, afinal você é um político ou não é?" E para a criança: "Claro, claro, meu netinho, já estou de mãos para o alto. E agora, onde você quer que eu me esconda?"
    O garoto deu uma risada marota: -" Debaixo da cama, depressa!".
    -"Sim, sim! Exclamou o Senador, agachando-se e arrastando-se para debaixo da cama, como se a sua coluna fosse a de um jovenzinho. De lá, gritou para o neto:
    - "Agora, é sua vez. Deixe a arma em cima da cama e procure um bom esconderijo...Agora mesmo, vou achar você!" O menino fez o mandado direitinho e foi assim, com alguma lábia e um pouco de esforço que o Senador conseguiu safar-se. E, vida afora, lá em Brasília ele continua safando-se quando o interpelam: "Claro, claro, os outros é que armaram tudo. eu não sei de nada..."

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